Em
momentos como este, diante do papel em branco, sinto imensa vontade de ter
aquela “iluminação” que só os escritores talentosos conseguem ter. Estar com o
pensamento em ebulição e não conseguir transcrevê-los fidedignamente é uma
limitação que me inquieta profundamente. Talvez os escritores também digam que
pensamentos não se concretizam, mas há algo
na escrita deles que me faz sentir os
sentimentos que eles escrevem. É exatamente este algo que me falta no momento de me expressar concretamente.
Ressalvadas
as limitações textuais, eu, desavergonhadamente – como já tenho demonstrado agir
ao promover encontros como o que vou relatar – sinto imensa necessidade de
falar de uma curta e eterna tarde de quinta-feira em Lisboa, mais precisamente,
como “num filme dos anos 1940”, na Gare do Oriente. Encontro que começou a ser
gestado devido a uma negativa que recebi ao pedir alguns exemplares de livros à
alguém. O que têm de bom os nãos... e nem sempre percebemos o quanto eles são “aditivos”...
Numa
tarde qualquer aqui em São Tomé, inquieta para dar à minha amiga São Lima o
presente que deixei em Lisboa, passo os olhos pelos emails que recebo – porque
sabia que lá estaria o email do meu escritor – e, mais uma vez,
desavergonhadamente, escrevo ao Luandino Vieira uma cartinha breve pedindo os
tais livros, e – admito – fui embora sem esperança de resposta. Para minha
surpresa e alegria, não só recebi uma resposta – adorável – e troquei com o Luandino alguns poucos
emails importantes sobre literatura, como recebi, mais tarde, uma caixa com
vários dos livrinhos publicados pela editora NÓSSOMOS, totalmente descompromissada
financeiramente – uma atitude digna de um sujeito preocupado com a literatura,
com a divulgação da literatura.
Mais
uma vez, deixando de lado toda a minha timidez e meu embaraço em conhecer novas
pessoas, comecei a falar com escritores daqui de São Tomé que eu queria
presentear o Luandino com literatura são-tomense. Falei com Conceição Lima,
Albertino Bragança e Manuel Teles Neto, que não hesitaram em me enviar seus
livros. Com as obras deles em minhas mãos, começa, assim, a leve e instigante
novela do “marcar o encontro” com o Luandino para, enfim, trocarmos livros e
palavras. Como a São Lima estava em Portugal, claro, comecei a incluí-la em
nossas mensagens e ela concordou – feliz – em participar do filme!
Antecipei
minha viagem para o Brasil por questões pessoais, e mantive o contato com São e
Luandino. Até o último minuto eu assumo que achei que nos desencontraríamos,
que tudo não passava mesmo de uma ficção. Contudo, no dia 21 de fevereiro deste
ano, uma quinta-feira fria em Lisboa, na Gare do Oriente, desenhou-se a cena
final do filme que estava sendo produzido desde o primeiro email, e iniciou-se
um encontro repleto de delicadezas e emoções finas, sutis.
Um
farol no dia cinzento.
Cheguei
antes dos dois (até que o Luandino me disse que já havia chegado desde a hora
que me ligou, e eu estava no aeroporto, acabando de chegar do Brasil); São
viveu uma narrativa paralela ao nosso encontro – perdeu o celular, arranjou
outro, procurou uma maneira de acessar a net e pegar meu número, me ligou do
celular de um estranho solidário... – e nos abraçamos na Gare. Como o nosso
esperado amigo se demorava, ligamos para ele. E em minutos, eis que surge o
Luandino para completar a nossa cena. Descemos da plataforma 7 e nos sentamos
num restaurante ali mesmo na Gare. Brindamos com vinho, comemos arroz de pato,
trocamos presentes, falamos de assuntos descompromissados e suaves,
esquecemo-nos um pouco do mundo que corria em redor de nós.
Como
por em palavras o que apenas consigo trazer na minha alma? Como posso explicar que
um encontro, com aparência de simplicidade, possa me tirar sorrisos de canto
dos lábios em momentos completamente (ad)diversos? Como falar dos olhos
marejados da São à entrada de Luandino no vagão do trem? Como lembrar da razão
exata por que meus olhos também marejaram?
Meus
caros São Lima e Luandino Vieira, quem dera fossem vocês a escrever esta minha
tentativa de escrever. Talvez tivéssemos um texto mais bonito, inspirado (?)...
Mas sou eu a que tenta, apenas por intuição, e levada pela graça do momento em
que estivemos juntos.
Para
que não se perca a leveza, mas que fique marcada a importância do encontro,
pontuo...
Nenhum comentário:
Postar um comentário